Terapia cognitivo-comportamental é caminho para novas conexões neurais


TCC foi criada por um psicanalista e se propõe a treinar a mente a suprimir pensamentos e comportamentos disfuncionais

Rodrigo de Almeida Ferreira explica que a TCC ajuda o paciente a criar novos processos mentais para lidar com as dificuldades(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)

"Nosso cérebro está sempre mudando, criando e desfazendo conexões, formando novas redes, e isso resulta em novos pensamentos"
Rodrigo de Almeida Ferreira, psiquiatra

Você já ouviu falar em profecia autorrealizável? É quando as crenças do indivíduo determinam o comportamento dele. Para os mais afoitos, não se trata aqui de crença traduzida em preceitos religiosos, éticos ou morais. Nada disso!

Mas da crença proveniente de um cérebro julgador e sujeito a acreditar em situações que não espelham a realidade. Quer um antídoto para esse pensar e agir que costumam travar o indivíduo na hora de alcançar seus objetivos?

“Tratar o pensamento como hipótese sobre a realidade e não como algo autorrealizável”, ensina o psiquiatra Rodrigo de Almeida Ferreira, de 38 anos, graduado em medicina e mestre em neurociência pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e especialista em terapia cognitivo comportamental (TCC).

Dito assim, parece fácil. Mas, de fato, não é. É preciso treino. E é essa a proposta da TCC, de uma forma bem resumida, para pacientes que queiram aprender outros hábitos por meio de novas conexões neurais.

SIMPLIFICANDO

“Nosso cérebro está sempre mudando, criando e desfazendo conexões, formando novas redes e isso resulta em novos pensamentos e comportamentos”, destaca Rodrigo.

De acordo com o psiquiatra, a terapia criada nos anos 1960 por Aaron T. Beck, que morreu aos 100 anos em 2021 (veja biografia abaixo), se propõe a ajudar o paciente a construir permanentemente novos processos mentais para lidar e superar dificuldades.

E isso tudo em um prazo pré-determinado de duração do processo terapêutico, que se pretende curto, se comparado a outros tratamentos psiquiátricos.

Diante do enunciado da TCC, não estariam os adeptos dessa técnica simplificando resoluções para processos mentais complexos?

Rodrigo sorri e responde de pronto: “Por que complicar?”, para em seguida explicar a metodologia: “Vai filtrando (a TCC) para pegar o que é central e determinante para a pessoa melhorar, concentrando energia não em processos explicativos e pouco úteis”.

Com base nesse parâmetro, ele prossegue em sua tratativa de fazer entender uma terapia que procura também, digamos assim, formar autoterapeutas. Isso significa dizer, em um contexto de alta do processo terapêutico, ter ensinado ao paciente atenção plena (mindfulness) para mediar conflitos, lidar com eles e, na medida do possível, superá-los.

PENSE MAGRO 

A velha e, para muitos, ‘satânica dieta’ tem na TCC um esteio para quem se propõe a ‘pensar magro’. Existe até um livro, de autoria da filha do criador da TCC, Judith Beck, que propõe a seus leitores um treinamento de seis semanas.

Rodrigo – ele próprio se beneficiou do método, que está disponibilizado em sua página do Instagram – detalha como funciona superar o sobrepeso. “Posso ficar sem comer doce por dois meses. Eu consigo, mas no final desse prazo não terei aprendido nada fazendo isso”, explica.

O terapeuta, então, revela como aprender com os métodos explicados no livro “Pense magro, treine seu cérebro a pensar como uma pessoa magra”, de Judith Beck, com quem Rodrigo fez treinamento e aprendeu a técnica que hoje emprega em seu consultório.

Segundo ele, é preciso, para quem se candidata a fazer dieta, ter disponibilidade para treinar a mente “com intenção, consistência e repetição”. Para isso, adianta, é necessário ter disciplina. “E isso é treinável”, garante. Rodrigo lembra que nascemos com “uma mente aberta, curiosa e não julgadora” e que, por motivos e práticas diversas, ela (a mente) foi ‘corrompida’ pela educação dos pais ou responsáveis pela criança e do ambiente onde ela cresceu.

Nesse caso, o método do ‘Pense magro’ aponta para aprender uma nova maneira de comer e de se relacionar com o próprio corpo, aliada à dieta, conforme o estabelecido por profissionais da área de nutrição.

Com esse novo paradigma, sustenta Rodrigo, o paciente não só aprende a perder peso, mas a manter o que considera ideal. Para pacientes com comorbidades físicas diversas ou transtornos relacionados ao sobrepeso, a TCC também possui recursos. “Pessoas com sobrepeso ou obesidade, com frequência sofrem também de transtornos de ansiedade, de humor ou de compulsão alimentar.

A terapia cognitivo-comportamental também se mostra eficaz no tratamento dessas comorbidades ao ensiná-las a identificar e modificar seus pensamentos distorcidos e comportamentos disfuncionais”, diz.

Por dentro da terapia cognitivo-comportamental (TCC)

“Aaron T. Beck (1921-2021) foi o psiquiatra e psicoterapeuta norte-americano que desenvolveu a terapia cognitivo-comportamental (foto) na década de 1960. Psicanalista de formação, no início, ele buscava submeter a psicanálise ao método científico para ampliar a sua utilização. Quando os resultados não comprovaram os pressupostos básicos da psicanálise nem demonstraram sua eficácia, Beck foi levado a considerar explicações alternativas, que culminaram na terapia cognitivo-comportamental (TCC).

Segundo a TCC, nossos conflitos emocionais e dificuldades de comportamento não são provocados por um domínio obscuro de nossa mente, mas sim por pensamentos que estão prontamente acessíveis à nossa consciência. Beck demonstrou que, com um papel ativo do terapeuta, as pessoas aprendem como avaliar seus pensamentos, obter melhoras significativas no humor e alcançar seus objetivos. O trabalho do psiquiatra foi replicado e aperfeiçoado continuamente ao longo das décadas por inúmeros pesquisadores ao redor do mundo.

Atualmente, a TCC é reconhecida como a psicoterapia que reúne maior base de evidência científica que comprova sua eficácia no tratamento de uma variedade de transtornos mentais, como depressão e transtornos de ansiedade.”

Fonte: Estado de Minas / Saúde e Bem Viver 


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