Jovem de Guarujá, no litoral de SP, viralizou no Tik Tok com postagem sobre a Síndrome de Tourette — Foto: Arquivo Pessoal |
Com apenas 15 anos, a estudante Victoria Nobre Fernandes é obrigada não só a lidar com os dilemas comuns aos adolescentes, mas também com Síndrome de Tourette, condição descoberta em setembro do ano passado e que, de forma involuntária, a faz emitir sons, palavras e xingamentos. No caso da garota, ainda há os tiques, movimentos e gestos corporais que não consegue controlar e que por muitas vezes a machucam.
“Não posso pegar em faca, não posso estudar direito, não posso lavar a louça, pegar em prato e segurar as coisas, porque eu as jogo”, contou a menina moradora Guarujá, no litoral de São Paulo, que viralizou em um vídeo no TikTok ao pedir para que as pessoas compartilhassem a publicação, que teve mais de três milhões de visualizações, e onde explica o que é a Síndrome de Tourette.
Segundo a jovem, o objetivo dela com a exposição dos vídeos é justamente tentar normalizar a síndrome, e mostrar às pessoas que ela não emite sons, xinga ou faz gestos porque quer, mas que essa é uma condição da tourette.
“Quero que as pessoas se conscientizem sobre essa síndrome. Muitos julgam sem entender. Me sinto vítima [do desconhecimento]”, disse ela que, muitas vezes, é atacada nas redes sociais. “Nem respondo haters [quem manda mensagem de ódio]”.
"Não gosto de viver com a [síndrome de] tourette. Ela me machuca bastante, me atrapalha no dia a dia. É difícil conviver com ela", desabafa a estudante.
A mãe da adolescente, Lucineide Nobre Bispo, de 57 anos, contou ao g1 que precisou largar o emprego para cuidar da filha e da mãe que está acamada. Para ela, as redes sociais ajudam a jovem, que é incentivada por muitos seguidores. Ao mesmo tempo, conta como é difícil ver os poucos que ofendem a filha.
“As pessoas precisam ter noção sobre esse problema e respeitar o ser humano. Ela é uma adolescente, não é uma usuária de drogas, ela não está fingindo”, desabafa a mãe.
Menina e a mãe enfrentam batalhas diárias — Foto: Arquivo Pessoal |
Lucineide fala da luta diária de ambas e das dores psicológicas causadas pela tourette. “A síndrome da Victória é terrível. Ela se machuca. Tenho que correr e segurar a mão dela, o pescoço dela. É horrível. A machuca e me machuca quando vejo. Dói muito”
“Pelo fato de ter 15 anos, isso [síndrome] é inaceitável para ela. Abracei a causa dela. Estou correndo com psicólogos, psiquiatras e neurologistas.
Descoberta
Victoria contou que os alertas sobre os tiques foram feitos por uma professora. A princípio, a adolescente acreditou que tinha relação com a ansiedade, pois se considera uma pessoa muito ansiosa.
Entretanto, quando foi tomar a dose de reforço da vacina contra a covid-19, uma enfermeira perguntou se ela acompanhava aqueles sintomas, no caso, os tiques. Ela disse não e a profissional agendou uma consulta com um médico clínico geral, que a encaminhou para uma neurologista. Foi quando veio a indicação de que poderia ser Síndrome de Tourette.
Jovem de Guarujá, no litoral de São Paulo, quer normalizar a Síndrome de Tourette — Foto: Arquivo Pessoal |
A menina passou por exames e nenhum problema foi detectado. Esta síndrome, inclusive, é diagnosticada pelo neurologista, com base nos sintomas.
Victoria conta que sempre que uma palavra ou som fica na cabeça, costuma repeti-la. Desde que recebeu a indicação de que tem a síndrome a adolescente é medicada para controlar os impulsos involuntários.
“O que eu ouço eu reproduzo. Então o que fica na minha cabeça vira tique”, diz Victoria.
Síndrome de Tourette
O médico neurologista Edson Amâncio explicou que a síndrome geralmente se manifesta na adolescência e não é notada em nenhum exame neurológico. Portanto, o diagnóstico é clínico, como citado acima. Após a descoberta, deve ser iniciado tratamento com medicação e, segundo ele, com psicoterapia, opção que traz ótimos resultados.
“Ela se manifesta na infância e adolescência, mas pode desaparecer completamente no início da fase adulta ou pode persistir durante toda a vida, mas geralmente quando persiste é com gravidade reduzida, e pode ser intermitente, em que passa uma longa temporada sem tique nenhum e de repente volta”.
Segundo ele, a síndrome se caracteriza por “tiques motores, gritos inarticulados, acompanhados de palavras articuladas, com ecolalia [repetição de palavras] e coprolalia [palavras de cunho sexual, por exemplo]”.
Amâncio ressalta que a síndrome pode ser confundida com transtorno compulsivo obsessivo, mas aponta que são diferentes. Ele disse ainda que muitos tiques podem ser ocasionados pela síndrome, mas não ganham destaque porque a condição geralmente é atrelada aos quadros em que as pessoas xingam, falam alto e fazem gestos.
O que pode ocasionar
“Outras comorbidades acompanham a Síndrome de Tourette, como a ansiedade exagerada, estresse, então não é uma coisa muito simples de definir”, disse o médico, que acrescentou a possibilidade da hereditariedade, ou seja, de a questão ser genética, biológica.
Os tiques motores, segundo ele, envolvem encolhimento do ombro, piscar, fazer careta, produzir sons como gritinhos, pigarro, fungada – são tiques frequentes e mais brandos.
Tratamento
Amâncio ressalta que hoje há medicação disponível e específica que podem cuidar muito bem dos tiques. Assim como a psicoterapia.
“Hoje os recursos terapêuticos são muito avançados. Pode ser que você amenize nos casos mais graves, mas nos mais leves você consegue dominar completamente. É questão de acertar a medicação”, finaliza.
Fonte: G1