No entanto, nas consultas, raramente são feitas perguntas sobre o estado mental das pessoas
Pesquisadores da Universidade de Cambridge e do King's College London divulgaram estudo que mostra que mais da metade dos pacientes com doenças autoimunes crônicas enfrentam distúrbios psicológicos, como ansiedade e depressão. No entanto, nas consultas médicas, raramente ou nunca são feitas perguntas sobre seu estado mental. O levantamento, que contou com 1.853 participantes, foi publicado na revista científica “Rheumatology” no fim de julho.
Idosa com cachorro: estudo mostra alto nível de distúrbios psíquicos em pacientes com doenças autoimunes — Foto: Rea Shapiro para Pixabay |
Entre os pacientes com doenças autoimunes, 89% sentiam fadiga extrema, 70% enfrentavam algum tipo de disfunção cognitiva, 57% sofriam de ansiedade e 55% de depressão. O quadro era significativamente mais grave do que os próprios médicos – que também foram entrevistados pelos pesquisadores – estimavam.
A situação é, em parte, consequência do modelo que foca nos sintomas da enfermidade e acaba deixando de lado o bem-estar psíquico dos indivíduos. Além disso, muitas pessoas temem abordar questões mentais e ficar estigmatizadas. Sua autoestima está em baixa e elas acham até que poderão ser chamadas de exageradas ou mentirosas. Aproveito a pesquisa para resumir um instigante seminário online, que acompanhei no começo do mês passado, sobre o que é uma abordagem com foco no ser humano, e não na doença, em quadros de distúrbios mentais.
O ponto alto do evento foi o depoimento de Stacey Roberts, nascida e criada em Ashland, Ohio. Assistente social há 29 anos, é um “peer supporter”, ou seja, trabalha para dar apoio a quem precisa encontrar a própria voz para fazer valer seus desejos e direitos. Stacey sabe bem o que isso quer dizer: aos 19 anos, foi diagnosticada com esquizofrenia paranoide.
“Foram 31 anos de medicação pesada, que me causaram problemas no fígado e nos rins. Apesar de sempre ter sido funcional, carreguei o peso da vergonha por minha condição durante décadas. Nos grupos de suporte que frequentei, tinha que me identificar como esquizofrênica, era o que me definia. Dos 19 aos 44 anos, minha autoestima era baixíssima, resultado da abordagem típica do modelo médico tradicional.”
Há sete anos ela entrou para o programa do Centro Nacional de Práticas Avançadas Centradas na Pessoa (NCAPPS em inglês), cujo foco é o “modelo de recuperação”. Médicos como Jerry Strausbaugh e James Mooney enfatizam que o caminho é criar um ambiente seguro, de empatia, no qual “as perguntas são feitas com delicadeza”, como afirmou o segundo. Para entender a diferença entre as duas abordagens:
Modelo médico tradicional:
- A doença é resultado de desequilíbrio químico ou de outras causas biológicas.
- A abordagem é: o que há de errado com você?
- O foco está na doença e no que há de defeituoso no cérebro.
- A recuperação está associada ao controle dos sintomas.
- Comportamentos vistos como desviantes não são tolerados e medicamentos são o centro da terapia.
Modelo de recuperação:
- Os distúrbios mentais são complexos, não foram entendidos completamente, e fatores culturais, sociais e ambientais desempenham papel importante em sua manifestação.
- A abordagem é: o que aconteceu com você?
- O foco está no bem-estar, nas forças que a pessoa tem.
- A recuperação significa ter uma vida plena.
- Comportamentos desviantes são vistos como uma tentativa de lidar com o problema.
Fonte: G1