Principal rio do estado está em alerta máximo para seca há quase dois meses. Baixa do manancial causou deslizamentos, erosões em pontos turísticos da capital e em estação de tratamento de água que abastece mais de 250 mil pessoas em Rio Branco.
Vista aérea mostra recuo do Rio Acre com avanço da seca — Foto: Asscom governo do Acre |
Em situação de emergência desde o dia 11 de junho por conta da seca antecipada, o Rio Acre, principal afluente do estado, está abaixo de 2 metros na capital há mais de 40 dias. Nesta sexta-feira (26), o manancial marcou 1,51 metro, sendo este o menor registro em 2024 até então, e o pior para o período nos últimos cinco anos.
A situação contrasta com a vivenciada entre fevereiro e março, quando o Acre passou pela segunda maior enchente de sua história desde 1971, ano em que a medição começou a ser feita. Na época, a inundação provocada pelo Rio Acre fez com que mais de 11 mil pessoas deixassem suas casas.
Rio Acre em março de 2024 (à esquerda) e em julho de 2024 (à direita) — Foto 1: Eldérico Silva/Rede Amazônica Acre — Foto 2: João Cardoso/Rede Amazônica |
Agora, mais de quatro meses depois, os acreanos vivem o contrário da cheia (entenda mais abaixo), com prejuízos em diversos setores como:
- Na irrigação de plantações que haviam sido destruídas pela cheia;
- no abastecimento de água; e
- em erosões em espaços públicos.
Prejuízos no plantio
O alerta máximo para seca em Rio Branco é de 2,69 metros, acendendo atenção para problemas como falta d'água e irrigação de plantações em comunidades isoladas da capital. O rio está abaixo desta marca desde o dia 28 de maio, quando o registro foi de 2,68 metros. Dois dias depois, em 30 de maio, a marca apontada pela Defesa Civil municipal foi de 2,52 metros.
A situação alertou para um período de seca que, segundo especialistas, pode se antecipar e se tornar cada vez mais frequente em um menor espaço de tempo.
"A previsão que temos do Instituto de Pesquisa Internacional é que para os próximos meses, ainda teremos chuvas abaixo do normal. Isso significa que se a previsão estiver certa, teremos menos água e isso é exatamente quando entramos nesta época seca. Estamos no caminho de um verão antecipado", disse Foster Brown, pesquisador em Ciências Ambientais da Universidade Federal do Acre (Ufac).
Ilhas começam a aparecer conforme rio seca — Foto: Asscom governo do Acre |
Os meses seguintes, junho e julho, foram de quedas sucessivas nas medições e cenários ainda mais preocupantes sobre falta de chuvas.
Os produtores, por exemplo, relataram que a seca tem atrasado o crescimento das plantações, a exemplo do milho, da macaxeira e da melancia, já que não há chuvas significativas na região. Eles já haviam sido afetados pela cheia, quando o nível do Rio Acre havia estragado seus plantios.
"Era para começar a colher em outubro, mas acho que não vai chegar no tamanho ideal para mercado. Provavelmente não vai dar mercado. O período mais crítico da produção é nos 30 primeiros dias de vida, quando tem o trabalho para desenvolver, mas acabou perdendo esse período por conta da seca e atrasou", lamentou o produtor Pedro Ferreira, que recomeçou em março, mas agora depende da natureza para irrigar o plantio.
Comunidades rurais também começaram a ser abastecidas com água em junho. O plano de contingência de escassez hídrica começou atendendo 29 comunidades e a meta é distribuir 30 milhões de litros de água. Inicialmente, 19 mil pessoas devem ser beneficiadas.
No dia 14 de junho, a situação já estava mais crítica: foi registrada a marca de 1,99 metros. O acumulado de chuvas em Rio Branco durante todo mês de junho não passou de 21,1 milímetros, sendo que o esperado era de 60 milímetros. O Rio Acre perdeu 85 centímetros de lâmina d'água durante o período.
No dia 28 de junho, o prefeito de Rio Branco, Tião Bocalom, também assinou um decreto de emergência em razão do baixo nível do Rio Acre e da falta de chuvas.
Moradores começaram a receber água nessa segunda-feira (17) — Foto: Arquivo/Defesa Civil de Rio Branco |
Erosões e prejuízos no abastecimento
Estas sucessivas reduções ocasionaram erosões no Calçadão do Novo Mercado Velho, no Centro da capital, um dos principais pontos turísticos de Rio Branco. No dia 12 de julho, parte do espaço, mais precisamente 270 metros, foi interditado por conta dos riscos para a população. Duas semanas antes, a Passarela Joaquim Macêdo, também na mesma região, foi interditada pelo mesmo motivo.
Erosão no Calçadão da Gameleira tem provocado queda nas vendas no local, em Rio Branco, segundo comerciantes — Foto: José Rodinei/Rede Amazônica |
A baixa do nível do Rio Acre também trouxe problemas na Estação de Tratamento de Água II (ETA II), responsável pelo abastecimento de mais de 60% da cidade de Rio Branco, o que compreende um universo de mais de 250 mil pessoas espalhadas por mais de 50 bairros. Na última quarta-feira (24), parte da ETA II desabou e afetou na distribuição de água.
Depois da alagação subiu muito rápido o nível [do Rio Acre] e aí quando baixou também saiu levando muita coisa. Então desde março desse ano a estrutura começou a ficar mais precária. Entrou em pré-colapso.
— Enoque Pereira, diretor-presidente do Serviço de Água e Esgoto de Rio Branco (Saerb)
Cenário do Rio Acre em julho
Neste mês, o Rio Acre começou marcando 1,77 metro. Houve aumento no nível em apenas cinco dias, mas nenhuma subida significativa, segundo a Defesa Civil municipal, que classifica como oscilação. (Veja mais abaixo)
Em Rio Branco, o único dia que choveu este mês foi em 8 de julho, quando houve o registro de 58,6 milímetros na capital. Em todos os outros, não teve mais nenhum registro sequer com chuvas em Rio Branco. A quantidade de chuvas esperadas para o mês é de _______ milímetros.
Apesar de ter sido uma chuva significativa, teve uma subida de apenas três centímetros, saindo de 1,75 metro para 1,78 metro. Em todo o mês, o nível mais alto registrado foi em 3 de julho, com o manancial medindo 1,86 metros em Rio Branco.
- Veja medição do Rio Acre em Rio Branco em julho de 2024
- Última marcação de junho marcou 1,81 metros; não houve medição no domingo (21)
- Nível do Rio Acre em Rio
- Branco1/72/73/74/75/76/77/78/79/710/711/712/713/714/715/716/717/718/719/720/721/722/723/724/725/726/71,41,51,61,71,81,9
Fonte: Defesa Civil Municipal
Pior cenário para a época
Com base nos dados da Sema, se analisado este mesmo dia em Rio Branco, a medição de 2024 é a menor dos últimos cinco anos, e a única que mais se aproxima da cota histórica de 2022, que é de 1,25 metro. O manancial, inclusive, está a menos de 30 centímetros da marca. (Veja abaixo)
- Medição do Rio Acre no dia 26 de julho em Rio Branco:
- Análise considera os anos de 2020 a 2024
- 2,22,21,821,821,841,841,921,921,551,5526/07/202026/07/202126/07/202226/07/202326/07/202400,511,522,5
Fonte: Secretaria Estadual de Meio Ambiente
A seca antecipada fez com que o governo montasse um gabinete de crise, em vigor até 31 de dezembro, para discutir e tomar as devidas medidas com redução dos índices de chuvas e dos cursos hídricos, bem como do risco de incêndios florestais.
O coordenador estadual da Defesa Civil, coronel Carlos Batista, disse que o Rio Acre estava com uma média de vazante de cinco centímetros por dia, e que por conta disto, cotas mais baixas que a registrada nesta sexta (26) devem ser registradas ainda neste mês de julho.
"Temos redução dos mananciais e com essa redução dificulta um pouco a captação de água. Então, há todo esse problema na agricultura, na pesca [...] mas toda a estrutura da Defesa Civil Estadual, todo o sistema estadual do órgão está de prontidão", complementou.
Toda a Bacia do Rio Acre está em situação de alerta máximo para seca, agravado em razão da falta de chuvas na região. Esta situação generalizada, ou seja, na capital e em municípios onde passa o Rio Acre, perdura há pelo menos um mês.
Rio Acre vivenciou cheia histórica em 2024; quatro meses depois, situação é de seca extrema em Rio Branco — Foto: Andryo Amaral/Rede Amazônica |
No ano passado, o decreto de emergência foi publicado em outubro. O coordenador estadual da Defesa Civil, coronel Carlos Batista, disse que o plano estadual de contingenciamento já foi elaborado.
O mesmo quadro foi observado em 2016, ano com a segunda pior seca. Em 17 de setembro, o rio atingiu a menor cota histórica da época: 1,30 metro.
Fonte: G1 AC