Olímpiadas: assistir a eventos esportivos faz bem à saúde? Psicólogos respondem


Nervosismo, ansiedade, alegria, frustração e tristeza são alguns dos sentimentos que nos cercam durante as partidas

Sentimento de pertencimento a um grupo é um dos principais benefícios do bem-estar — Foto: Freepik

A vibração do chão, o sentimento de pertencimento, o nervosismo, a ansiedade, a torcida, a alegria, todas as emoções fazem parte do conjunto de ações que presenciamos quando estamos assistindo a um evento esportivo. Seja ao vivo ou pela televisão e internet. Não precisa ser fã de esporte, todo mundo que torce e vibra por algo ou alguém já sentiu esse frio na barriga.

Com o início das Olimpíadas, pesquisadores da Universidade Anglia Ruskin, na Inglaterra, descobriram que pessoas que assistem a esportes experimentam maior bem-estar do que aquelas que não assistem, têm menos sintomas de depressão, solidão e se sentem mais felizes socialmente.

"Por bem-estar, queremos dizer o estado psicológico de uma pessoa ou quão bem alguém se sente. Pessoas com bem-estar mais alto tendem a ter melhor saúde física e viver mais do que pessoas com bem-estar mais baixo", escreveram os autores em um artigo publicado no The Conversation.

A pesquisa usou dados de 7.209 adultos, com idades entre 16 e 85 anos, que vivem na Inglaterra e que participaram da Pesquisa Taking Part encomendada pelo governo do Reino Unido.

"Descobrimos que as pessoas no Reino Unido que assistiram a um evento esportivo ao vivo no ano passado estão mais satisfeitas, sentem que suas vidas valem mais a pena e são menos solitárias do que as pessoas que não assistiram. Essas descobertas coincidem com outros estudos, que descobriram que as pessoas que assistem a esportes pessoalmente pelo menos uma vez por ano têm menos sintomas depressivos do que aquelas que não assistem", afirmou a chefe da Escola de Psicologia e Ciência do Esporte da Universidade Anglia Ruskin e autora principal do estudo, Helen Chaves.

Além dela, assinam o artigo a professora associada de Psicologia da Universidade Annelie Harvey e a doutoranda em Psicologia Rachel K Ownsworth.

A psicóloga Cristiane Moreira, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia, afirma que o que promove esse bem-estar é o sentimento de pertencimento das pessoas, necessidade natural do homem que faz parte do movimento de grupo, e a percepção que temos sobre nós em relação ao grupo social.

— Mais do que assistir esportes o que promove a saúde mental é sentir que está conectado e que compartilha interesses com outras pessoas. O que vai na contramão do nosso funcionamento social individualista. A torcida também facilita a expressão de emoções, como uma forma de catarse. Sentir que pertencemos a um grupo pode funcionar como um apoio social — explica Moreira.

Um exemplo de formação em grupo é a comunidade que compartilhamos com pessoas que torcem pelos mesmos times esportivos que nós. Pesquisas mostram que pessoas que se identificam fortemente com um time esportivo têm mais probabilidade de se sentirem emocionalmente apoiadas por outros fãs, o que aumenta a satisfação com a vida.

Para a vasta maioria que vai acompanhar as Olimpíadas pela televisão e internet, os benefícios não se perdem, segundo as especialistas

Aqueles que assistem a esportes são mais propensos a relatar maiores sentimentos de realização na vida do que aqueles que não assistem. A pesquisa mostrou ainda que pessoas que assistem esportes na TV ou na internet também ficaram menos deprimidas do que aquelas que não assistiram, e sintomas depressivos foram ainda menos prováveis para aquelas que assistiram esportes com certa frequência.

Segundo a coordenadora de psicologia da rede Mater Dei, Helenilma Lopes, os altos níveis de excitação que sentimos ao assistir um evento esportivo conecta o corpo do espectador ao esporte e ao atleta. Ou seja, as pessoas acabam sentindo as mesmas sensações e vibrações do competidor, como: a angústia, a ansiedade e o nervosismo antes e durante a competição, bem como a alegria, euforia e glória, em caso de vitória, ou, em contrapartida, a tristeza da derrota e a frustração.

— Este é um fenômeno que revela uma dinâmica complexa de identificação e desejo porque através do outro você projeta sua perspectiva de sucesso. Você projeta sua perspectiva social, se sente parte do todo. Reconhecido como identidade de grupo. É a dinâmica mesmo de reconhecimento através do esporte — explica a psicóloga.

Um outro estudo japonês descobriu, por meio de imagens cerebrais, que as áreas do cérebro associadas a recompensas psicológicas (sentir-se bem) eram mais ativas quando os participantes assistiam a um esporte popular, como futebol e vôlei, do que a um esporte menos popular, como golfe.


Lado negativo

Ao viver uma forte emoção, o corpo libera hormônios que aceleram a frequência cardíaca, aumentam a pressão arterial e levam à sensação de que o coração está “na boca”. Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) descobriram em estudo que há uma maior incidência de infartos, por exemplo, durante os jogos do Brasil na Copa do Mundo.

Com base nos dados dos Sistemas de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH/SUS), gerenciados pelo Ministério da Saúde, eles observaram que as disputas levam a um aumento de 4% a 8% nos casos de infarto.

— Não só na Copa do Mundo, mas em outros eventos esportivos também, porque assim como há a glória e a felicidade, em caso de derrota, há a tristeza, a raiva e a frustração. São sempre sentimentos extremos e controversos dos dois lados — afirma Lopes.

Em entrevista recente ao GLOBO, o cardiologista do grupo Fleury, Ricardo Alonso recomendou que as pessoas devem realizar uma avaliação com seu clínico ou cardiologista antes dos eventos esportivos.

— Para aqueles que são muito estressados e ansiosos, recomendo que realizem uma avaliação, visando uma adequação, inclusão ou mudança de conduta terapêutica. É importante buscar a estabilidade do ponto de vista clínico e emocional, podendo até ser necessário o uso de medicamentos que diminuam o grau de ansiedade e estresse — diz o cardiologista.

Os pesquisadores não observaram a fundo o perfil dos acometidos, mas consideram que a probabilidade é que aqueles que tiveram um infarto já tinham problemas prévios de saúde que tornavam a saúde do coração mais frágil. O infarto é causado pela formação de coágulos que interrompem o fluxo sanguíneo e consequentemente a oxigenação do órgão, de forma súbita e intensa.

Quando o coração já está vulnerável devido a problemas adjacentes, como hipertensão arterial, obesidade, colesterol alto, diabetes, histórico de doenças cardíacas na família ou sedentarismo, pode bastar um evento que funcione como um gatilho para que o infarto aconteça.

— Quem sofre de problemas no coração, pressão alta, obesidade, diabetes e outras comorbidades necessita de cuidados especiais e a cautela deve ser ainda maior durante eventos esportivos, principalmente em competições com o Brasil, quando o grau de ansiedade e estresse emocional fica mais elevado, podendo ser um fator de risco adicional — afirma Alonso.


Fonte: O Globo





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