Crianças podem ser más? Especialistas explicam


Motivações podem envolver ambiente violento, abusos, traumas e negligência, entre outras questões

Casos de crianças praticando atos de crueldade contra outras pessoas ou animais sempre chocam a sociedade: é possível que, ainda na infância, um ser humano possa cometer violências e agressões, sem demonstrar o menor sinal de remorso? Não é comum, mas isso pode, sim, acontecer, por diferentes motivos.

Crianças que maltratam animais ou outras crianças podem ser psicopatas? — Foto: Unsplash

“Nenhuma pessoa é igual e nenhum caso isolado pode ser tomado como exemplo para a maioria”, esclarece a psiquiatra Tâmara Marques Kenski, diretora da Ilumina Clinic (SP). Segundo ela, alguém pode ter certo comportamento em resposta a uma situação específica, enquanto outra pessoa pode ter o mesmo comportamento, porém, com causa diferente. Não dá para generalizar.

Um comportamento cruel ou extremamente agressivo, partindo de uma criança, pode estar ligado a múltiplas questões. Segundo a psiquiatra, pode estar ligado a fatores genéticos, emocionais, traumas, medos, entre outros. “As principais motivações podem envolver um ambiente familiar violento, um abuso, talvez uma negligência familiar...”, exemplifica. “É preciso analisar também se a criança está copiando algo que presenciou. Ela pode estar imitando um comportamento que foi observado de um adulto, pessoalmente ou nas mídias”, afirma. Há ainda a possibilidade de ser algum comportamento feito por alguém contra ela, ou seja, a criança foi a vítima de outra pessoa e tenta fazer igual. “Existem, também, as questões emocionais. Algumas crianças têm desregulação emocional, dificuldade em compreender as próprias emoções e as emoções dos outros. Isso pode, sim, resultar em um comportamento extremo”, aponta.

Tâmara lembra também que eventuais traumas podem contribuir para esse tipo de ação com violência. “Crianças que já sofreram abusos ou outros traumas podem desenvolver mecanismos e comportamentos mais agressivos”, destaca.


Situação pontual, transtorno ou caráter?

Em cada caso é preciso separar, antes de avaliar e entender o que está acontecendo. Um comportamento cruel de uma criança pode ser um caso pontual, com motivação específica. “Também pode ser consequência de um transtorno psiquiátrico ou de um transtorno psicológico, de caráter”, explica o psiquiatra e psicoterapeuta, Wimer Bottura, membro da Associação Brasileira de Psiquiatria e presidente do Comitê de Adolescência da Associação Paulista de Medicina. “Se for uma questão psiquiátrica ou psicológica, na maioria das vezes, existem tratamentos. Se for um transtorno de caráter, a situação é muito mais complexa”, avalia.

Para ele, a depender da idade, a criança, em geral, nasce com um potencial empático grande e, portanto, tem consciência quando está fazendo mal a alguém, “Agora, uma criança que tenha alguma condição específica, como um transtorno de desenvolvimento intelectual, entre outros, talvez não perceba”, diz ele.

O diagnóstico não é simples e depende de avaliação clínica, observação e questionários. Não há um exame laboratorial ou físico que defina se a criança tem transtornos psiquiátricos ou psicológicos que a levem a agir com violência, o que pode tornar a margem de erro maior. “É preciso ter cuidado porque o próprio diagnóstico errado pode agravar o quadro”, alerta. “Uma rotulação de um problema grave de uma criança pode vir a gerar o problema, agravar aquilo que não precisaria ser grave”, reforça. Intepretações equivocadas e superficiais, como quem julga que se trata de psicopatia, criam um estigma, marginalizam e oferecem o estímulo necessário para que, aí sim, a criança fique doente, lembra o médico.


Psicopatia em crianças: isso existe?

A psiquiatra Tâmara explica que não existe diagnóstico oficial de psicopatia em crianças. “Não é um diagnóstico realizado oficialmente, mas alguns traços, que chamamos de traços antissociais, podem ser observados”, diz ela.


Alguns destes sinais são:
  • Manipulação, quando a criança tem tendência a enganar ou manipular alguém para conseguir o que deseja.
  • Falta de empatia, que é quando há dificuldade em entender e se importar com o sentimento do outro.
  • Impulsividade.
  • Agressividade frequente, seja verbal ou física
  • Desrespeito persistente a regras e limites
  • Isolamento social e dificuldade em manter relacionamentos saudáveis com outras crianças
Para a especialista, é importante lembrar que nenhum desses fatos, sozinho, representa um diagnóstico. “É preciso que tudo seja visto de uma maneira completa e que a criança seja avaliada por profissionais”, orienta. “O que os pais podem e devem fazer é buscar ajuda ao notar comportamentos persistentes, que não ocorrem de forma isolada.

Os tratamentos, segundo os médicos, podem envolver terapia comportamental, terapia familiar e intervenção escolar. “É importante a família agir cedo e buscar orientação de profissionais especializados na saúde mental infantil”, completa.


Fonte: Revista Crescer



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