Maiana Guerra falou sobre o sentimento contraditório de viver o luto, mas sentir leveza com a decisão. Paulo Cesar Guerra, de 55 anos, teve morte encefálica após um AVC. Ele doou rins e fígado.
A imagem da Linha Vermelha, uma das mais importantes vias expressas do Rio de Janeiro, parada para a passagem de um fígado, na manhã desta terça-feira (11), sensibilizou o Brasil e fez a trancista Maiana Guerra chorar quando estava em um cartório fazendo o atestado de óbito do pai.
Maiana é filha de Paulo Cesar Guerra, de 55 anos, que teve morte encefálica em decorrência de um Acidente Vascular Cerebral (AVC), e foi a responsável por autorizar a doação de órgãos.
Maiana Guerra com o pai, Paulo Cesar Guerra. — Foto: Arquivo pessoal |
Nesta quarta-feira (2), a trancista se reuniu com a família no Cemitério de Maruípe, em Vitória, para a última despedida do pai, e falou sobre o sentimento contraditório, de viver o luto, mas sentir leveza com a decisão tomada.
“Me informaram que foram feitos dois exames no meu pai e que tinham desligado o sedativo dele durante 10 horas, sem que fosse notada reação ou reflexo algum. Com a confirmação da morte encefálica, me falaram que, no momento difícil de perda, ele ainda era um possível doador se eu aceitasse ou algum familiar. [...] Eu tô vivendo dor, tristeza e luto, mas é um sentimento contraditório, não consigo descrever, só quem tiver nessa situação, se tiver empatia com o outro, vai sentir essa leveza”, disse.
Segundo Maiana, um enfermeiro do hospital ligou e informou que não havia compatibilidade identificada no Espírito Santo, mas que seria possível doar os rins do pai para um rapaz em São Paulo, e o fígado para uma senhora no Rio de Janeiro.
Primeira na fila do transplante, Maria Elena Gouveia, de 69 anos, foi a receptora carioca. Ela foi avisada ainda na noite de segunda-feira (30) que teria que dar entrada no hospital até a meia-noite, mas, um tiroteio na comunidade de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, onde mora, atrasou a saída da família e a internação só foi feita às 6h.
Usualmente, quando um órgão chega de avião, uma equipe o leva de helicóptero até o hospital da cirurgia, mas o Hospital Silvestre, no Cosme Velho, não tem área para pouso.
Por isso, o transporte na cidade foi feito de carro e o fechamento da via foi necessário para minimizar o tempo gasto no percurso.
A trancista estava no cartório, resolvendo questões burocráticas, quando viu a imagem da Linha Vermelha parada.
“Uma amiga mandou mensagem falando que saiu no jornal que o órgão do meu pai parou uma via no Rio de Janeiro. Antes disso, o enfermeiro do hospital já tinha mandando uma mensagem falando ‘olha que coisa bonita’, mas eu nem tinha aberto, pensei que fosse uma mensagem pronta, agradecendo aos familiares que doam os órgãos. Mas aí quando eu abri, caí no choro, no cartório mesmo. O meu pai tá morto e tem alguém vivendo com o órgão dele, isso traz alegria”, relatou.
Maiana falou ainda sobre a surpresa do pai poder ser doador e reforçou a importância das pessoas se informaram sobre o assunto.
“Quando me falaram sobre a doação eu perguntei ‘alguma coisa vai servir?’. Porque o meu pai não levava uma vida saudável, bebia, fumava há mais de 30 anos. E nunca nada foi conversado sobre isso. As pessoas tem que estar cientes que independente do tipo de vida que leva ou a forma da morte e pessoa pode ser doadora. [...] Meu pai, mesmo morto, ajudou mais de uma pessoa, trouxe vida, literalmente, uma vida melhor. Eu perdi uma, mas ganhei duas. Não preciso estar perto e conviver para saber que elas vão estar bem”, desabafou.
Fonte: G1 ES