Iniciativa da presidência brasileira à frente do fórum global conta com a adesão de mais de 80 países; Argentina entrou na última hora
Lula na abertura da cúpula de chefes de Estado do G20, no MAM — Foto: LUDOVIC MARIN/AFP
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou oficialmente nesta segunda-feira a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza na Cúpula do G20, principal iniciativa da presidência brasileira à frente do fórum global, que já conta com a adesão de mais de 80 países. Em seu discurso de abertura da cúpula de chefes de Estado, o presidente agradeceu a "generosidade" dos líderes presentes, que transformarão "o Rio de Janeiro na capital do mundo" nestes dois dias cúpula. A Argentina, que inicialmente não estava na lista de participantes, decidiu aderir a iniciativa após o anúncio.
— A Aliança nasce no G20, mas seu destino é global. Que esta cúpula seja marcada pela coragem de agir. Por isso quero declarar oficialmente lançada a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza — disse. — É muito importante o que vamos discutir aqui, e eu tenho certeza que, se nós assumirmos a responsabilidade por esses assuntos da fome e da pobreza, poderemos ter sucesso em pouco tempo.
Com a Argentina, a iniciativa conta com a adesão de 148 membros fundadores, incluindo 82 países, a União Africana, a União Europeia, 24 organizações internacionais, nove instituições financeiras internacionais e 31 organizações filantrópicas e não governamentais.
No lançamento da iniciativa, o presidente brasileiro descreveu a capital fluminense, "que é conhecida como Cidade Maravilhosa", como a "síntese dos contrastes que caracterizam o Brasil, a América Latina e o mundo":
— De um lado, a beleza exuberante da natureza sob os braços abertos do Cristo Redentor, um povo diverso, vibrante, criativo e acolhedor. De outro, injustiças sociais profundas. O retrato vivo de desigualdades históricas e persistentes.
Segundo relatório recente da FAO, cerca de 733 milhões de pessoas passaram fome no mundo em 2023. O contingente equivale às populações de Brasil, México, Alemanha, Reino Unido, África do Sul e Canadá juntos, destacou Lula.
— São mulheres, homens e crianças, cujo direito à vida e à educação, ao desenvolvimento e à alimentação são diariamente violados — acrescentou Lula. — Em um mundo no qual os gastos militares chegam a dois trilhões e quatrocentos bilhões de dólares, isso é inaceitável.
De acordo com o presidente brasileiro, o G20 representa 85% dos US$ 110 trilhões do PIB mundial e responde por 75% dos US$ 32 trilhões do comércio de bem de serviço, além de dois terços dos 8 bilhões de habitantes do planeta Terra.
— Compete aos que estão aqui, em volta desta mesa, a inadiável tarefa de acabar com essa chaga que envergonha a humanidade. Por isso, colocamos como objetivo central da presidência brasileira no G20 o lançamento de uma aliança global contra a fome e a pobreza. Este será o nosso maior legado. Não se trata apenas de fazer justiça. Esta é uma condição imprescindível para construir uma sociedade mais próspera e um mundo de paz.
Posição da Argentina
Inicialmente, a Argentina era o único país membro do G20 que não iria aderir à aliança — o governo brasileiro já sabia desde o início da semana passada que o governo de Javier Milei, um admirador de Donald Trump, poderia não apoiar as principais bandeiras da presidência brasileira no bloco. Mas, de última hora, o país anunciou sua adesão após não constar em uma primeira lista não oficial.
Após a confirmação da incorporação da Argentina à lista, um negociador argentino explicou a mudança de posição:
— Aderimos com nossos próprios princípios e fundamentos sobre macroeconomia estável, condições de investimento e geração de emprego.
A Argentina de Milei tem sua própria versão para explicar por que o presidente argentino decidiu apoio a principal proposta de Lula na cúpula do Rio. Houve, em palavras dos argentinos, “um esforço para encontrar a criatividade que era necessária para contar com a adesão da Argentina”. Ou seja, o relato da Casa Rosada é de que suas demandas foram aceitas, priorizando a adesão de um país vizinho e de peso na região. Outra fonte do governo argentino disse que “a aliança é flexível, e cada país poderá escolher sua forma de adesão”.
Milei e Lula, cujos países fazem fronteira, têm uma relação tensa desde antes de o governante argentino assumir o poder em dezembro. O presidente argentino é crítico do multilateralismo e lidera em seu país uma forte política de corte de gastos públicos em meio ao combate à inflação. O outro lado do seu ajuste foi uma forte recessão econômica e um aumento de 11 pontos na pobreza, que afetou 53% dos cidadãos argentinos durante o primeiro semestre de 2024, segundo dados oficiais.
Fonte: O Globo