Oito vítimas foram asfixiadas e uma teve traumatismo em 1º de dezembro de 2019. Processo está na fase de audiências para ouvir testemunhas em 2025 antes de interrogar réus. Depois Justiça decide se agentes irão a júri popular pelos homicídios. Acusados respondem em liberdade.
Jovens mortos em Paraisópolis — Foto: Arte/TV Globo |
Cinco anos após o caso que ficou conhecido como "Massacre de Paraisópolis", a Justiça de São Paulo ainda nem interrogou os policiais militares acusados pela ação que deixou nove jovens mortos e outros 12 feridos em 1º de dezembro de 2019 durante um baile funk na comunidade da Zona Sul.
Somente após essa etapa do processo, que faz parte da audiência de instrução, é que o juiz do caso, Antonio Carlos Pontes de Souza, poderá decidir se há indícios de crimes cometidos pelos 12 réus para irem a julgamento popular.
A ação da Justiça de submeter alguém ao júri é chamada de pronúncia. Outra possibilidade é a da absolvição sumária. Não há previsão, no entanto, de quando o magistrado dará essa decisão.
O crime completa meia década neste domingo (1º).
Atualmente, 11 agentes da Polícia Militar (PM) e um ex-agente respondem em liberdade pelos crimes de homicídio por dolo eventual de nove jovens (por terem assumido o risco de matá-las quando as encurralaram num beco em Paraisópolis) e de lesão corporal na mesma modalidade eventual de outras 12 vítimas (por assumirem o risco de feri-las).
Testemunhas de defesa
Mas antes de interrogar os acusados, o magistrado terá de ouvir os depoimentos das testemunhas do caso. Seguindo o rito processual, isso têm de ocorrer antes dos interrogatórios.
A Justiça marcou para as 10h do dia 31 de janeiro de 2025 os depoimentos de oito testemunhas de defesa dos réus. A audiência ocorrerá no Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste. Essa será a sexta audiência de instrução no processo.
Os acusados não serão interrogados nessa sessão, segundo o Tribunal de Justiça (TJ). Apesar disso, eles podem acompanhar os depoimentos no fórum. Assim como os familiares das vítimas.
Laudo da perícia da Polícia Tecnico-Científica, concluiu que oito dos jovens morreram por asfixia e um por traumatismo. Nenhuma deles morava no bairro (saiba mais abaixo quem são).
Os parentes de quem morreu criticam a lentidão da Justiça para dar um desfecho ao caso.
"Não é nem uma questão de opinião, é uma certeza de que a Justiça do nosso pais é uma vergonha, muito desumano isso tudo", disse nesta semana ao g1 Maria Cristina Henrique, mãe de Denys Henrique, um dos mortos na ação da PM.
"A demora mantém o luto pelas vítimas aceso e impede que o sepultamento seja efetivamente realizado", falou a promotora Luciana Jordão, representante do Ministério Público (MP), responsável pela acusação.
"É difícil para nós lidarmos com isso, porque o prazo deste processo, que é bastante complexo, acaba se excedendo. Por outro lado, há a preocupação com cada uma das famílias e uma tentativa de acolhimento, além da luta para que o julgamento seja breve sem que a prova seja perdida", afirmou a promotora, que espera que os réus sejam pronunciados e julgados até 2026.
Indenizações
De acordo com a Defensoria Pública, as famílias das vítimas já foram indenizadas pelos assassinatos cometidos pelos PMs. Os pagamentos ocorreram em 2021 por determinação do governo de São Paulo após representação do órgão.
Segundo a denúncia do Ministério Público, há quatro anos os agentes da Polícia Militar entraram em Paraisópolis e encurralaram as vítimas num beco sem saída, provocando as mortes de nove jovens.
Os PMs alegaram que perseguiam dois suspeitos de roubo que estavam numa moto -- que nunca foram encontrados. Em suas defesas, disseram ainda que as vítimas morreram acidentalmente ao serem pisoteadas após um tumulto provocado pelos bandidos.
Mais de 5 mil pessoas estavam se divertindo no local e saíram correndo após a intervenção policial, segundo mostram vídeos gravados por testemunhas e câmeras de segurança e acabaram compartilhados à época nas redes sociais (veja nesta reportagem).
Ainda de acordo com a Promotoria, os PMs fecharam as vias de acesso ao baile e impediram os frequentadores de deixar uma viela da comunidade. Depois passaram a agredir os jovens, provocando tumulto.
Vídeos de agressões
Justiça decide se PMs do Massacre de Paraisópolis vão a júri popular
Vídeos gravados por moradores mostram as agressões durante a dispersão. Ainda segundo a denúncia da Promotoria, os PMs deram golpes de cassetetes, garrafas, bastões de ferro e gás de pimenta. Um dos policiais lançou um morteiro contra a multidão.
Depois os PMs jogaram bombas em direção às vítimas. Muitas pessoas não conseguiram sair do beco e morreram sufocadas, prensadas umas às outras. Laudo necroscópico confirmou que a maioria delas morreu asfixiada por sufocação indireta.
Além da condenação, o MP requer a fixação de valor mínimo para reparação dos danos materiais e morais causados pelas infrações.
Segundo a Secretaria da Segurança Pública (SSP), 11 PMs réus no caso do Massacre de Paraisópolis, "foram transferidos e ocupam funções compatíveis com seus graus hierárquicos".
Somente um dos PMs acusados não continua mais na corporação: foi expulso por ter cometido uma infração disciplinar grave que não tem relação com as mortes dos nove jovens. A Polícia Militar não informou qual foi a irregularidade.
12 réus
Veja abaixo quem são os 12 réus acusados de envolvimento nas mortes das vítimas em Paraisópolis e por quais crimes respondem.
- tenente Aline Ferreira Inácio - acusada de homicídio
- subtenente Leandro Nonato - homicídio
- sargento João Carlos Messias Miron - homicídio
- cabo Paulo Roberto do Nascimento Severo - homicídio
- Luís Henrique dos Santos Quero - homicídio (ex-cabo da PM; foi expulso da corporação por outros motivos não informados)
- cabo Gabriel Luís de Oliveira - homicídio
- soldado Anderson da Silva Guilherme - homicídio
- soldado Marcelo Viana de Andrade - homicídio
- soldado Mateus Augusto Teixeira - homicídio
- soldado Rodrigo Almeida Silva Lima - homicídio
- soldado José Joaquim Sampaio - homicídio
- soldado Marcos Vinicius Silva Costa - homicídio
9 mortos após ação da PM
‘Paraisópolis: 3 atos, 9 vidas’: filme quer mostrar que ação em baile funk foi massacre
Os PMs são acusados de participar dos assassinatos de nove pessoas; veja quem são as vítimas e como morreram:
- Mateus dos Santos Costa, 23 anos, morreu por traumatismo
- Gustavo Xavier,14 anos, morreu por asfixia
- Marcos Paulo Oliveira, 16 anos, morreu por asfixia
- Gabriel Rogério de Moraes, 20 anos, morreu por asfixia
- Eduardo Silva, 21 anos, morreu por asfixia
- Denys Henrique Quirino, 16 anos, morreu por asfixia
- Dennys Guilherme dos Santos, 16 anos, morreu por asfixia
- Luara Victoria de Oliveira, 18 anos, morreu por asfixia
- Bruno Gabriel dos Santos, 22 anos, morreu por asfixia
Defesa dos PMs
Protesto de moradores nesta quarta-feira (1), no Centro de São Paulo, em lembrança aos dois anos da morte de 9 jovens de Paraisópolis. — Foto: ALLISON SALES/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO |
De maneira geral, os PMs réus no processo alegam por meio de suas defesas que dois suspeitos na moto, que nunca foram identificados ou presos, teriam entrado na festa e atirado na direção das viaturas que os perseguiam, provocando pânico entre os frequentadores, que correram para uma viela onde teriam tropeçado uns sobre os outros. O lugar não tem saída e é conhecido como Viela do Louro.
Segundo os policiais, houve resistência dos frequentadores, que teriam agredido os agentes com paus, pedras e garrafadas. Os policiais disseram que, por segurança, foi preciso usar cassetetes, balas de borracha, bombas de gás e de efeito moral para dispersar a multidão que participava do evento.
Entre 5 mil e 8 mil pessoas participavam do tradicional Baile da DZ7 naquela madrugada na comunidade de Paraisópolis. O ritmo do funk ecoava nas caixas de som animando uma juventude que se reuniu para celebrar a vida na periferia em três ruas: Rodolfo Lutze, Iratinga e Ernest Renan.
Fonte: G1