Juiz que se envolveu com mulher de traficante tem condenação mantida


O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) negou pedido de revisão de decisão contra Vanderlei Ramalho Marques, condenado à aposentadoria compulsória em 2021

Sede do CNJ: decisão foi tomada em sessão nesta terça-feira (18), em Brasília. (Reprodução)

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) negou pedido de revisão feito pela defesa do juiz Vanderlei Ramalho Marques, mantendo a sentença que o condenou à aposentadoria compulsória em agosto de 2021. À época, o então magistrado havia sido acusado de, entre outras práticas consideradas ilegais pela Lei Orgânica da Magistratura (Loman), manter relacionamento íntimo com uma mulher que respondia criminalmente por ligação com o tráfico de drogas.

Ao solicitar a revisão da sentença condenatória proferida pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), a defesa de Vanderlei Ramalho alegou, nos autos, o surgimento de supostos fatos novos, capazes de alterar o entendimento da corte estadual.

O relator do pedido no CNJ, o conselheiro Marcello Terto, entretanto, disse que os elementos apresentados pelo advogado Henrique Zumak, durante sustentação no plenário do conselho nessa terça-feira (18), em Brasília, não eram capazes de gerar revisão ou anulação da condenação do magistrado. O voto que negou provimento à ação foi acompanhado à unanimidade pelos demais conselheiros.

"Recebemos duas petições do requerente, no último dia 13 (de fevereiro). Uma trazendo supostos fatos novos, amparados na participação do Ministério Público (MPES), na fase preliminar do processo de origem, sem autorização do Tribunal de Justiça do Espírito Santo. A outra pede o desentranhamento dos documentos (...) Não me convenceu (a defesa) de que existam fatos novos para mudar o entendimento inicial. Portanto, estou mantendo a improcedência do pedido de revisão", afirmou o relator em seu voto.

Entre os argumentos da defesa também estava a alegação de que as provas citadas no processo que culminou na condenação do juiz não eram concretas o suficiente para fundamentar a pena a ele aplicada, principalmente os relatos acerca de seu envolvimento com a mulher que respondia criminalmente por relação com o tráfico de drogas.

O conselheiro relator dos autos, por outro lado, frisou que o TJES, ao condenar o magistrado, levou em consideração relatos concretos feitos pela então detenta à inspetora da unidade prisional em que ela estava à época.

Por nota, a defesa do magistrado informou que ainda não teve acesso ao teor integral da decisão colegiada do CNJ, e que, "assim que obtiver pleno conhecimento da deliberação, adotará as medidas cabíveis junto ao Supremo Tribunal Federal (STF)".


Investigação e condenação

O TJES decidiu aposentar compulsoriamente o juiz Vanderlei Ramalho Marques em 19 de agosto de 2021. A pena máxima prevista em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) foi aplicada, entre outros motivos, porque o magistrado manteve relacionamento íntimo com uma mulher que respondia a uma ação por relação com tráfico de drogas, num processo conduzido pelo próprio juiz. Além disso, o marido dela era réu na mesma ação, segundo os autos.

A mulher havia passado 37 dias presa e obteve liberdade provisória graças a uma decisão do magistrado que manteve, no entanto, o companheiro dela na cadeia.

Vanderlei Marques era juiz da 4ª Vara Criminal da Serra e a ré, como condicionante para a liberdade provisória, comparecia periodicamente ao fórum da cidade. Foi numa dessas ocasiões, em 2015, de acordo com registros testemunhais que constam nos autos do PAD, que o magistrado a abordou.

Após conversas por telefone e mensagens por aplicativo, o magistrado convidou a mulher para sair e disse que poderia ajudar na soltura do marido, narrou o relator do processo administrativo na ocasião, o desembargador Fernando Bravin, em sessão do Pleno do TJES.

O relacionamento durou 11 meses. Em depoimento, a acusada de tráfico contou ao relator do PAD que decidiu terminar quando percebeu que o magistrado não iria ajudar o marido dela, que seguia preso.

O Ministério Público Estadual (MPES) recorreu da decisão de soltura e ela voltou à prisão pouco após o fim do romance.

"Ele falava que ia me ajudar, ficou enrolando para marcar as audiências", afirmou a mulher, ainda no âmbito do PAD. Ela disse que o magistrado chegou a ir, de carro, à porta da casa dela. Os encontros entre o magistrado e a acusada aconteciam, segundo a mulher, nos finais de semana.

Além do depoimento da ré, no PAD foram ouvidas ainda uma promotora de Justiça, que notou, nas audiências, um tratamento "estranho" conferido pelo magistrado à acusada de tráfico, e uma inspetora penitenciária a quem, antes mesmo da instauração do PAD, a mulher havia confidenciado o relacionamento.


PRINTS DE CONVERSAS

Além disso, foram juntadas capturas de tela de celular, de conversas por mensagens entre a acusada de tráfico de drogas e o juiz Vanderlei Ramalho Marques, ao processo que condenou o magistrado. O interlocutor aparece identificado como "Val". O juiz disse que é "montagem".

"O linguajar utilizado tem indicação de redação gramaticalmente correta atribuída ao magistrado. Teria a parte (a mulher) que imaginar que teria que fazer uma grafia correta para o juiz e uma grafia com excesso de erros para ela", registrou o relator do PAD, em seu voto à época da apreciação da denúncia pelo TJES. "São detalhes relevantes", complementou.

Nos diálogos, o juiz, ainda segundo o relator, diz que a mulher deveria estar satisfeita por estar solta. As mensagens mostram um grau de intimidade entre os dois, registrou o desembargador. Para ilustrar, Bravin mencionou que, em uma das conversas, a mulher "pede para o juiz presidir a audiência com sua gravata vermelha".

Depois "(ela) se viu acuada em relacionamento com falsas promessas de liberdade para ela e para o companheiro", resumiu o então desembargador relator.

O marido, acusado de tráfico, também foi ouvido no PAD. O relator narrou ter ficado impressionado com os depoimentos da mulher e do companheiro dela, que não narraram os mesmos fatos, mas tal incongruência deu ainda mais veracidade aos relatos.

Fonte: A Gazeta



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