Parentes das aranhas e dos escorpiões, esses bichinhos invisíveis que se alimentam dos restos de sua pele podem desencadear processos alérgicos respiratórios; saiba como se livrar deles
Você sabia que cerca de dez por cento da população mundial sofre com crises alérgicas causadas por ácaro? Segundo a American College of Allergy, até 90% dos portadores de asma alérgica, em algumas regiões, têm sensibilidade a eles. E, sem querer fazer alarde, certamente esses monstrinhos pequeninos estão na sua casa, na sua cama, dormindo com você e se alimentando de seus restos de pele.

O ácaro se alimenta de restos de pele de humanos e animais - Foto: JustLife/Adobe Stock
Os ácaros são animais pertencentes a classe dos aracnídeos, logo, são parentes das aranhas e dos escorpiões. Muita gente acha que eles são insetos, mas não. O que os aproxima dos insetos é o fato de serem artrópodes, como explica Antonio Carlos Lofego, professor da Unesp, campus de São José do Rio Preto, que pesquisa ácaros há mais de 30 anos.
“Os aracnídeos são reconhecidos por terem quatro pares de pernas e não possuírem antenas, os insetos têm três pares de pernas e um par de antenas e os crustáceos tem um número variável de pernas e dois pares de antenas”, esclarece o pesquisador.

Esses monstrinhos microscópicos são responsáveis por crises alérgicas e podem ser encontrados facilmente em nossas camas e travesseiros. Foto: Reprodução/Tenuipalpidae Database/https://www.tenuipalpidae.ibilce.unesp.br/
Ainda de acordo com Lofego, a grande maioria dos ácaros é muito pequena, com tamanhos que podem chegar a 0,1 mm de comprimento em algumas espécies, sendo assim invisíveis aos nossos olhos. Isso explica por que nunca os vemos caminhando por nossos lençóis nem travesseiros. “No caso dos ácaros da alegria, seu tamanho varia entre 0,2 e 0,4mm”, continua o professor.
Mas o que leva os ácaros a se proliferarem em nossas casas?
Basicamente, seus restos de pele. Segundo Antonio, “existe uma variedade enorme de diferentes tipos de ácaros, vivendo em todos os ambientes que podemos imaginar: solo, água, sobre planta, parasitando animais e até mesmo na nossa pele”.
Mas tem um que parece gostar muito do nosso estilo de vida: os ácaros da poeira domiciliar que são mais bem adaptados a viverem em nossas residências, desde que encontrem as condições ideais para sua sobrevivência.
Mas quais seriam essas condições? De acordo com o pesquisador, para que eles se proliferem em nossas casas basta que o alimento deles esteja servido - e ele é, principalmente, matéria orgânica oriunda da descamação da nossa pele e da pele dos animais domésticos que porventura você tenha em casa.

Os ácaros são aracnídeos, assim como as aranhas, os escorpiões e os carrapatos. Foto: Reprodução/Tenuipalpidae Database/https://www.tenuipalpidae.ibilce.unesp.br/
No entanto, ter restos de pele não é o bastante. Os ácaros também precisam que o ambiente seja propício para sua reprodução. “Uma temperatura adequada ao seu desenvolvimento, geralmente de 20º a 30º, e pouca iluminação”, explica.
“Assim uma casa com pouca circulação de ar, pouca entrada de luz solar e muitos tecidos que podem acumular matéria orgânica, como carpetes, tapetes, cortinas e colchões desencapados e sem tratamento antiácaros, podem constituir a condição ideal para criação e reprodução desses animais”, complementa o pesquisador.
Existe uma época do ano pior para eles se proliferarem?
Infelizmente, não. Para os ácaros, toda hora é hora. O que importa, segundo Lofego, são as condições ambientais no interior da residência. “Enquanto existirem as condições ideais, os ácaros estarão se reproduzindo e aumentando sua população”, explica.
Pode ser que eles não prefiram um período do ano a outro. Invernos mais secos e rigorosos, por exemplo, podem reduzir a presença deles em casa. Mas não impedem que eles se multipliquem. Isso porque em dias mais frios é comum fecharmos as janelas e isso diminui a ventilação dos ambientes, além de ser mais comum usar roupas e cobertores guardados há muito tempo, o que garante uma quantidade grande de ácaros neles.
Nesse ponto é importante lembrar que esses animais preferem ambientes úmidos e sem ventilação, além de locais com grande oferta de comida, como sua cama.
Sim, certamente, o inimigo dorme ao seu lado ou no seu travesseiro. É que segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia, depois de dois anos cerca de 10% a 25% do peso de um travesseiro pode ser formado por ácaros e células mortas da pele. Por isso, aconselha-se sua troca a cada dois anos.
Além disso, os excrementos e os ácaros mortos se dispersam em poeira fina, o que pode ser facilmente inalado e causar alergias, de acordo com a instituição.
Qual o lugar da casa preferido pelos ácaros?
Para o pesquisador, “podemos destacar principalmente os lugares onde dormimos e também as casinhas e caminhas de nossos pets” como os preferidos dos ácaros para morarem, alimentarem-se e reproduzirem-se.
“Pelo tempo que ficamos deitados deixamos uma grande quantidade descamação da nossa pele, assim há muito alimento disponível”, conta. Isso, aliado ao calor e umidade do nosso corpo, que ajuda a aquecer e manter um ambiente ideal para os ácaros. “Comida e condição climática ideal para eles, assim muita atenção deve ser dada aos nosso colchões e às caminhas de pets”, continua.

Segundo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia, depois de dois anos, cerca de 10 a 25% do peso de um travesseiro pode ser formado por ácaros e células mortas da pele. Foto: Satjawat/Adobe Stock
Como saber, por exemplo, se tem ácaro no travesseiro?
Infelizmente não há outra maneira de saber se tem ácaros em sua casa, cama, travesseiro. “O principal indício são sintomas de alergia, mas para uma verificação mais precisa é preciso fazer a aspiração do pó e observar esse material em um microscópio”, explica Lofego.
Apesar disso, é importante acreditar que eles existem e podem levar a crises alérgicas. “Trabalho há 30 anos com esses bichinhos e, muitas vezes, tentando convencer as pessoas de que eles existem”, brinca o pesquisador.
Existe uma forma de reduzir os ácaros em casa?
A principal maneira de se livrar dos ácaros é limpeza. “Lavando as roupas de cama e cortinas em temperaturas acima de 60º, aspirarando carpetes e colchões com frequência ou limpando com equipamentos a vapor”, aponta Lofego.
Ou seja, manter o ambiente sempre limpo, além de privilegiar uma arquitetura que facilite a entrada de luz solar, diminuir a umidade da casa, mantendo os ambientes bem secos e arejados.

De acordo com pesquisadores britânicos, arrumar a cama logo após acordar pode ajudar na proliferação dos ácaros. O ambiente quente e úmido é perfeito para esses animais. Foto: peterschreiber.media/Adobe Stock
Mito ou verdade sobre ácaros?
O biomédico Roberto Figueiredo, mais conhecido como Dr. Bactéria, viralizou em uma participação em um podcast aconselhando pessoas a não arrumarem a cama logo ao acordar pelos riscos de dar um ambiente mais propício para a reprodução desses animais. Antonio Lofego aponta que, apesar de parecer história de rede social, trata-se verdade.
Uma pesquisa da Universidade de Kingston, em Londres, mostrou que os ácaros não conseguem sobreviver em ambiente quente e seco encontrado comumente em uma cama desarrumada. Segundo o Dr. Bactéria, em um dos vídeos viralizados, quando as pessoas arrumam a cama logo após acordar, o calor e a umidade que deixamos pode ajudar os ácaros a se reproduzirem.
“Quando dormimos deixamos ali um ambiente bem favorável aos ácaros. Quando levantamos, cobrimos a cama com lençol ou edredom, e isso ajuda a manter essas condições - um ambiente quente, úmido e protegido da luz”, explica o pesquisador. “Assim, deixar o colchão sem nenhuma cobertura seria melhor opção, ou no máximo com um lençol fino e sempre mantendo o quarto arejado”, complementa.
O pesquisador também desmente um mito.
“Existe muita circulação de informação sem embasamento. Como um vídeo que vi uma vez em que a pessoa dizia que colocar o colchão no sol apenas ajudaria na reprodução dos ácaros, pois deixaria o colchão mais aquecido como eles gostam”, comenta.
“O fato é que eles não gostam de temperaturas muito altas (a temperatura ideal é entre 20º e 30º). Assim, em dias bem quentes com temperatura acima de 30º graus e com a radiação solar sendo absorvida pelo colchão, este atingirá uma temperatura mais alta do que a suportável pelos ácaros que podem assim morrer pelo calor excessivo, ou também pela baixa umidade, uma vez que aquecimento pode reduzir a umidade interna do colchão”, continua.
Segundo essa ideia, expor o colchão ao sol em um dia quente e seco é uma boa medida para reduzir ácaros desse colchão. Mas é importante lembrar que é preciso calor mais alto que 30º e um ambiente seco.
Os ácaros são realmente culpados por crises alérgicas respiratórias?
A resposta é sim. No entanto, é importante entender que outros elementos dispersos na poeira domiciliar podem provocar alergias, mas uma parcela bem grande dos casos é causado pelos ácaros. “Não os vivos, na verdade o que inalamos são suas fezes e/ou fragmentos do corpo de ácaros mortos que são leves o suficiente para ficarem suspensos no ar e serem inalados”, diz o pesquisador.
Outro ponto que é válido entender é que os problemas mais comuns provocados por esses animais são os respiratórios. No entanto, também é possível que eles causem também processos alérgicos na pele.
Fonte: Estadão