Virgínia e Edna dividiram sonhos e sala de aula por cinco anos. Conheça a história e os obstáculos enfrentados por mãe e filha
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Virgínia e Edna enfrentaram juntas o curso de enfermagem Reprodução/Arquivo Pessoal |
Ah, a universidade. Um período da vida em que geralmente as pessoas se especializam nas profissões que vão exercer durante toda a vida. Uma época de descobertas, de criar memórias, até mesmo despejar algumas lágrimas de estresse.
É também nessa época que costumam chegar alguns rostos novos nas nossas vidas, seja de professores ou de amigos que conquistamos durante os anos de graduação.
Para Virginia Chagas Bazilio, de 26 anos e Edna Andréia Godinho Chagas, de 54, no entanto, a experiência contou com rostos familiares, uma vez que mãe e filha levantarão juntas o diploma de Enfermagem em julho.
Começo da caminhada de mãe e filha
A caminhada das alunas mãe e filha da Multivix Vila Velha começou em 2020, quando Virgínia fez sua matrícula na faculdade. Cursar enfermagem sempre foi um sonho que a jovem nutriu.
Acontece que além do sangue, Virgínia e a mãe também compartilhavam o amor pela área de saúde e foi ela quem convenceu Edna a dar o grande passo de ingressar na graduação.
Inicialmente eu ia fazer o curso sozinha, mas sempre foi o sonho da minha mãe, ela sempre amou enfermagem. Quando fui me matricular, eu disse: mãe, vamos fazer juntas? Ela disse que tinha medo, porque era um compromisso grande, de cinco anos. Eu disse que o tempo ia passar de qualquer forma, a gente tinha que aproveitar. Ela fez o vestibular e entramos juntas, conta a filha orgulhosa.
O curso começou em junho de 2020, e apesar da empolgação inicial com a faculdade, a dupla teve que lidar com um grande balde de água fria chamado pandemia. Os dois primeiros semestres que seriam presenciais, precisaram ser feitos em casa, online.
Mesmo com as dificuldades de um EAD, mãe e filha não esmoreceram, até quando deram de cara com matérias complicadas e com alguns outros grandes acontecimentos na vida, como a gravidez, que Virgínia viveu ao lado da mãe.
“Foi muito gostoso fazer o curso juntas, confesso que quando começamos eu estava mais forte, mas depois engravidei e minha mãe ficou mais forte que eu. Então nos apoiamos o tempo inteiro, e ela cuidou de mim quando estava mais fraca que ela“, disse.
Mais que mãe e filha, amigas
Para Edna a graduação teve um sabor especial por ter sido cursada ao lado da filha. Ela acredita que a experiência na universidade ajudou a aproximar ainda mais as duas.
Além disso, para a cuidadora de idosos, o curso serviu para provar uma velha máxima: a de que não há idade para sonhar.

Foi maravilhoso, porque nos aproximamos mais, nos tornamos mais amigas além de ser mãe e filha. Isso me ajudou muito, porque sou mãe de seis filhos, incluindo minha enteada, que é minha filha do coração. Tive apoio do meu marido e dos meus netos, acredito que muitas mãe, se tivessem essa oportunidade
Foi maravilhoso, porque nos aproximamos mais, nos tornamos mais amigas, além de ser mãe e filha. E isso também me ajudou muito, porque sou mãe de seis filhos, porque tem a minha enteada, os meus netos. Tivemos todo o apoio, do marido, netos. Se você tem um sonho, não importa sua idade, só como vai realizá-lo. Agradeço por essa grande oportunidade, relatou.
Vencendo os desafios juntas
Quem já esteve na faculdade, sabe: nem tudo é um mar de rosas dentro de uma sala de aula. Há algumas noites mal dormidas estudando para provas, o nervosismo na hora de apresentar um trabalho.
E quando se trata de uma pessoa tímida? Falar em público é um pesadelo para muita gente, inclusive para a Edna, que sempre teve uma certa dificuldade para vencer o acanhamento.

A verdade é que ela sempre contou com um porto seguro chamado Virgínia. As provas e trabalhos em grupo e dupla, até que um dia, uma professora decidiu separar a dupla dinâmica.
“Ela sempre me colocava para praticar em frente ao espelho, eu decorava o texto e falava para ela. Quando fui apresentar esse trabalho sem ela, fui lá para a frente e a voz não saiu. Minha filha foi para a primeira fila e me incentivou muito, me deu força, depois da apresentação, a professora me elogiou muito, fiquei muito realizada e muito orgulhosa do papel da minha filha“, contou Edna.
Apesar da separação momentânea da mãe, Virgínia conta que entendeu o que a professora tentou fazer: tirá-las de sua zona de conforto.
“Nem sempre vamos estar juntas na profissão, então o que a professora tentou fazer é nos tirar da nossa zona de conforto, acabou sendo uma experiência muito proveitosa”.
E as provas, hein?
Não tem jeito, quem quer se formar na faculdade precisa encarar as tão temidas provas. Muitas vezes, são elas, aquelas folhinhas de papel, que são capazes de tirar o sono, torturar um aluno.
Isso acontece mais ainda com disciplinas que consideramos mais desafiadoras ou até mesmo, não temos a menor afinidade. E quando era o quarto período, Edna, se viu pendente em duas matérias: Saúde do Adulto e Saúde da Família.
Ela ficou triste, mas quem estava mesmo inconsolável, era a filha. Quando soube das pendências, Virgínia chorou, soluçou, por uma noite inteirinha. Mas mesmo com os olhos inchados, se decidiu a ajudar a mãe a se preparar para as provas finais.
Os afazeres da casa ficaram por conta dela, enquanto Edna enfiava a cara nos livros pela manhã e de tarde, saindo do quarto a noite para ir à faculdade. Todo o processo contava com o incentivo da filha e a frase “se lembre do que estudou” virou um mantra para as duas.
Ela me deu o maior incentivo, no dia da prova, ela pediu para uma vizinha cuidar do bebê dela e foi junto comigo. Ela me disse antes: se lembre do que você estudou, você é capaz. Quando passei, quase não deu para acreditar, foi uma felicidade enorme, disse.
Virgínia conta que o incentivo é uma forma de retribuir odo o apoio que recebeu da mãe, não apenas na faculdade, mas em outros períodos da vida.
“Eu disse para ela: você consegue, você é inteligente, capaz, muito boa. Você já me disse isso antes, agora é a minha vez de te dizer”, relatou.
O frio na barriga que a formatura traz
Treino é treino e jogo é jogo. O fim do curso se aproxima e com a formatura também chega o nervosismo, algumas inseguranças, é normal.
O assunto já foi até abordado por uma professora em aula: lembrem-se que a partir do semestre que vem já não existe mais faculdade, todos os alunos do décimo período já serão enfermeiros.
Para Virgínia, que trabalha como manicure e há três meses segue os passos da mãe, como cuidadora de idosos, o nervosismo está forte, mas a confiança de que é uma boa profissional supera qualquer ansiedade.
Eu acho que tudo novo traz um certo receio para a nossa vida. Nós tivemos uma aula, que a professora abordou esse assunto, seremos futuros enfermeiros. Sempre me pergunto se realmente estou pronta para o mercado de trabalho, para encarar uma UTI, um hospital, mas sei que nesses cinco anos nos doamos muito, nos qualificamos, sei que somos ótimas profissionais, disse.
Já para a mãe, a expectativa de erguer o diploma traz apenas um sentimento: a alegria, que ela mal pode conter.
“É uma felicidade incrível, estou me sentindo extremamente realizada por mim e também por minha filha, por essa conquista que atingimos juntas”.
Fonte: Folha Vitória