Criar fortes conexões sociais e dar um passo atrás ao se sentir sobrecarregado são algumas maneiras de lidar com o contágio

Somos seres sociais, então o contágio do estresse é normal. Mas há maneiras de evitá-lo. Foto: deagreez/Adobe Stock
A atual turbulência global deixa muitos de nós estressados. Mesmo que não sejamos diretamente afetados por conflitos, perdas de emprego ou mudanças no mercado que prejudiquem nossos planos de aposentadoria, talvez conheçamos outras pessoas que o sejam.
Manter o estresse sob controle é um desafio. E nos momentos em que tantas pessoas estão estressadas, evitar o contágio do estresse – a transmissão do estresse de uma pessoa ou grupo de pessoas para outras – pode ser ainda mais difícil, sobretudo por causa das onipresentes redes sociais, onde os fatores de estresse muitas vezes se amplificam.
“Tendemos a dar mais atenção os aspectos negativos das notícias”, diz Natalia Duque-Wilckens, professora assistente de ciências biológicas da Universidade Estadual da Carolina do Norte, então é isso que compartilhamos com os outros. “E assim acontece um enorme contágio de estresse, porque somos seres sociais e nos preocupamos com o que está acontecendo com os outros seres humanos”.
Mas não é impossível evitar o contágio do estresse. E tomar parte no estresse dos outros nem sempre é uma coisa ruim.
Criar conexões sociais fortes, dar um passo atrás quando a situação fica pesada demais, concentrar-se em coisas de que você gosta e tentar não contribuir para piorar o problema são algumas maneiras de lidar com o contágio do estresse, informam os pesquisadores.
A evolução do estresse
O estresse e as nossas reações a ele – coração acelerado, palmas das mãos suadas, inquietação, falta de sono – evoluíram para ajudar os seres humanos, outros animais e até mesmo os micróbios a responder às ameaças do ambiente.
“O estresse existe para nos ajudar a fugir dos predadores”, explica Stephanie Dimitroff, professora assistente de psicologia social na Universidade de Montana. Mas ele não evoluiu para nos ajudar a cumprir um prazo no trabalho, comenta ela.
Embora o estresse tenha “o objetivo de aumentar as chances de sobrevivência, ele pode se tornar prejudicial quando prolongado”, avisa Natalia.
O estresse crônico gera uma elevação persistente de hormônios – entre eles, o cortisol e a adrenalina, chamados hormônios do estresse – que podem promover o armazenamento de gordura, aumentar a pressão arterial e alterar a função imunológica. “Ele também perturba a função cerebral, contribuindo para transtornos de humor, como depressão e ansiedade”, observa Natalia.
O estresse pode ser contagioso
Tanto em humanos quanto em outros animais, o contágio do estresse é um fenômeno comum, em que o estresse de um indivíduo é transferido para outro.
A ecologista comportamental Hanja Brandl notou que os pássaros que ela estava estudando não se movimentavam tanto e eram menos propensos a interagir com outros animais quando estavam estressados. E não era apenas um pássaro individual que começava a agir assim, mas todo o grupo de pássaros.
“Se imaginarmos uma pessoa morando em um apartamento compartilhado com cinco amigos, e dois deles estão cronicamente estressados”, haverá uma mudança comportamental em todos, informa Hanja, pesquisadora de pós-doutorado da Universidade de Konstanz e do Instituto Max Planck de Comportamento Animal, na Alemanha.
A forma como o estresse se transfere entre os indivíduos não é totalmente compreendida, pondera Natalia, mas provavelmente depende muito da espécie.
“Nos roedores, o estresse geralmente passa por meio de cheiros e vocalizações agudas que são altas demais para serem ouvidas por nós”, explica ela.
Já os seres humanos são mais visuais. “Tendemos a perceber o estresse por meio de expressões faciais, postura ou tom de voz. A maneira como o estresse se espalha depende muito de como cada espécie se comunica”, esclarece ela.
Como as interações sociais ajudam
Mas o outro lado da moeda do contágio social é o benefício do apoio social, comenta Natalia. Quando uma pessoa ou animal que foi exposto a um fator de estresse tem a oportunidade de interagir com outro indivíduo, essa interação reduz o estresse.
“A interação social realmente tem um impacto positivo sobre nós, pois ajuda a reduzir a resposta ao estresse mais rapidamente”, nota Hanja. Conexões sociais ruins também estão associadas a uma série de doenças, até mesmo o câncer.
Uma pessoa estressada pode, a curto prazo, afetar negativamente as pessoas que a consolam, destaca Natalia. “Mas, ao mesmo tempo, esse mecanismo recíproco ajuda a manter a estabilidade do grupo a longo prazo”, diz. No futuro, os papéis podem se inverter.
O estresse está enraizado na imprevisibilidade e na incontrolabilidade, define Stephanie. “Se você tiver relacionamentos sociais de qualidade, vai sentir que a vida é mais controlável e mais previsível, porque você sabe que terá apoio quando precisar”, diz. “Se algo ruim acontecer, você terá um ombro amigo”.
Às vezes, é melhor se afastar
Os pesquisadores ainda não conhecem todas as variáveis que deixam alguns indivíduos mais propensos ao contágio do estresse, mas está claro que a empatia desempenha um papel importante. A pessoa empática sente profundamente as emoções dos outros. Essas emoções podem ser estresse, mas também felicidade, raiva ou medo.
“E isso não é necessariamente ruim, pois ajuda você a se conectar melhor com as outras pessoas”, pondera Stephanie.
Mas, segundo ela, quando você sentir que a situação está pesada demais, talvez seja mais prudente dar um passo atrás e reavaliar quanto tempo você está passando com determinadas pessoas. Se estiver com dificuldade para se blindar do estresse, avalia Stephanie, tente encontrar lugares da vida onde você possa melhorar o controle e a previsibilidade.
Faça algo que você adora
Afastar-se um pouco e fazer algo que você adora, como passear na natureza, pode ajudar a evitar a negatividade que traz estresse, acrescenta Natalia. “Esta é a minha saída”, conta. “Caminhar na natureza, pintar, ficar com meus gatos ou meu cachorro”.
Tome cuidado
E tenha cuidado para não piorar o problema, adiciona ela.
“Há uma linha muito tênue entre compartilhar informações que você considera importantes e exagerar na dose, compartilhando notícias estressantes de forma constante e rápida demais, sem tempo para refletir”, conclui Natalia.
Fonte: Estadão